quinta-feira, 30 de outubro de 2008

...entendendo o vazio...


Depois de postar
nada, falar sobre nada pode fazer sentido, não? Parece uma questão importante ressaltar onde se deseja chegar com a bienal que está acontecendo nesse momento e essa "proposta do vazio". Para começar, um pequeno texto que abre também a explicação do evento no próprio site da 28 bienal de arte de são paulo.


"Por sua própria definição, a Bienal deveria cumprir duas tarefas principais: colocar a arte moderna do Brasil não em simples confronto, mas em vivo contato com a arte do mundo, ao mesmo tempo em que, para São Paulo, se buscaria conquistar a posição de centro artístico mundial. "
[Lourival Gomes Machado, “Apresentação”. in: I Bienal do Museu de Arte Moderna de São Paulo, 1951, p. 14].

A exposição ficou conhecida como "bienal do vazio", mas seu tema real é "em vivo contato", muito pertinente para a proposta que se apresenta. Um evento das proporções da bienal, com sua importância mundial (no patamar próximo às gigantes Bienal de Veneza e Documenta Kassel), tem a função de revelar o que se tem feito de mais importante no mundo da arte, expor as "tendências" mundiais, criar diálogos regionais de modos de pensar a arte, de fazê-la, de entendê-la, e o que se faz na 28 bienal é justamente não só pensar essa produção contemporânea, mas pensar o modelo de exposição "bienal" no paradigma que vem sendo estruturado.  Grandes feiras, proporções gigantescas, variedade espetacular, orçamentos monumentais, etc., a bienal desse ano vai quase que na contramão disso, chegando ao ponto de deixar um andar inteiro vazio (alvo de vandalismo por parte de determinados pseudo-artistas na busca de exposição na mídia) para tornar mais forte essa questão. 

"Em lugar de tentar produzir uma visão totalizante e representativa do fenômeno da arte da atualidade, o importante parece ser delinear especificidades, produzir cartografias estruturais, pondo em marcha um processo de trabalho investigativo e crítico, regular e sistemático, que acompanhe e dê conta, de modo produtivo, dos movimentos e das transformações percebidos num circuito artístico determinado." - Ivo Mesquita e Ana Paula Cohen, curadores.

Que mudanças são essas de que o curador fala? O modo de fazer a bienal vem sendo o mesmo desde seu princípio, ou seja, 1951, quando o panorama artístico tanto nacional quanto internacional eram talvez coerentes com esse modo de exibição, e mesmo o pavilhão desenhado a seguir por Oscar Niemeyer também o fosse. De modo bastante grosseiro, aqui o movimento concreto era bastante forte, e a pintura dominava nosso país. Mesmo fora, ainda era ela quem reinava, embora já se encaminhasse para o que na década de 70 seria chamado de arte conceitual. No entanto, ao comparar com o que se produz hoje, vemos que a diferença é gritante. Se expandiram as fronteiras do que se entende por arte, onde ela pode chegar, mudou o modo como se ensina arte inclusive, assim como as preferências dos artistas, criaram-se novas relações, novos pensamentos foram introduzidos, visões políticas ou ideológicas, etc... A variedade hoje é tamanha que mapear de forma completa o panorama artístico mundial é uma tarefa no mínimo ingrata, mais precisamente, impossível. Sem falar que o papel do curador mudou, onde é ele que traça, pensa e interpreta a realidade e a arte ao montar "sua" exposição, com algo o que falar, uma história a contar, com coisas que ele vê como relevantes. Há ainda pouco tempo, eram as representações internacionais que enviavam seus artistas, mas a partir da última, a figura do curador "tomou o poder" para si, e esse já é um debate bastante inflamado que está acontecendo... 

Esse post foi mais para expor certas idéias do que está acontecendo com essa bienal, e recomendo, para que se entenda melhor ainda esse panorama de que falamos, que se vejam os vídeos no site da 28 bienal com os debates ocorridos antes do início da bienal (são os quadradinhos azuis nos meses de jun/out). 

Aqui, Raul Mourão coloca a entrevista do curador Ivo Mesquita à revista Bravo!.

Aqui, um link para várias entrevistas feitas em 2007 sobre essa proposta dos curadores.

E para finalizar, um link para uma entrevista ao estadão, com ambos curadores.

terça-feira, 21 de outubro de 2008

...micro contos...

A mostra do Sesc acabou, mas deixou muita gente satisfeita com o que mostrou.
Uma das obras, a que coloquei o link num dos primeiros posts sobre a mostra, foi a do conto no celular, chamada Literatura Celular. Se inscrevia o celular no site do Sesc e se recebia diariamente 3 micro contos de diversos autores. O intuito seria introduzir pequenos momentos literários inusitados na vida das pessoas. Chega a ser interessante microcontos no celular de um país onde a média de livros lidos por ano é menor que 1. Colocarei a seguir alguns contos. Não todos, pois meu celular estava ajustado para apagar mensagens mais velhas que 5 dias. E infelizmente, percebi isso tarde...

MOSTRA SESC DE ARTES 08:

_Amor deles agua de barrela: ele gostava do Rimbaud; ela do Rambo - Evandro Affonso Ferreira

_VENTRILOCO - Quem ta falando, eu ou voce? - Fernanda Siqueira

_SEREIA - Chegou na cela. Por que olha para esse copo d agua? O velho disse: 15 anos e nao sei. Chega agora e quer saber? - Ferrez

_PEDRA NO PESCOCO - kd vc agora? virei oceano sem adeus nem volta
tudo foi amor :,(
:,(
não era onda - Flavio Viegas Amoreira

_50 ANOS - De hoje em diante so faco o que quero. E cedo pra isso, disse minha mae, que nunca se deu ao luxo. - Ivana Arruda Leite

_PARTO - No lixao, a mendiga forca o bebe pra fora:Se tu entala, te faco voltar pra barriga, fio-da-puta - Joao Silverio Trevisan

_Mae, Alice me bateu. Nao liga, essa boneca e muto ignorante. - Livia Garcia-Roza

_O enfermeiro estava no elevador com o cadaver na maca.Acabou a luz. Ele acendeu um cigarro e ofereceu ao morto. - Marcelo R. Paiva

_O FOSSIL DE SILVIO SANTOS - Os dentes nao estavam mais la. Mas ele continuava sorrindo. - Mario Bortolotto

_A NOITE - sentou-se (quando parecia flutuar) e levantou-se (quando parecia cair): sempre a mesma insonia - Mauricio de Almeida

_Palavra ou magica?So uma opcao. Escolheu. Errado:nao era palavra. Mas o escritor sempre opta pela palavra. - Moacyr Scliar

_Tocou o sax antes de puxar a corda no pescoco. No espelho, o bilhete: aqui jazz. - Raimundo Carrero

_Essa tatuagem vai dorer? So no divorcio. - Reinaldo Martins

_QUEDA LIVRE - Maria Alice esqueceu a janela aberta. E sua atinha Wendy voou para a Terra do Nunca. - Sergio Roveri


ps.: adicionado em 06/05/09 - Por causa de um celular roubado perdi todos os microcontos que estavam na memória... Ainda bem que guardei alguns aqui...

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

...respiração mais...

A abrangência dessa mostra do Sesc é muito boa. Estão na mostra instalações, peças, músicas, concertos, intervenções, etc., e, a que comentarei agora, performances.

Performances são como que atos artísticos, numa mistura entre teatro e arte conceitual, o artista executa uma série de ações com o intuito de transmitir certa idéia, ou falar de determinado assunto. Na história da arte, temos muitos artistas performáticos famosos, como Marina Abramovic, ou Joseph Beuys, entre outros. No Brasil, encontramos os Irmãos Guimarães, que participaram dessa mostra sesc de 2008. Já participaram da Bienal de São Paulo com uma instalação, e em exposições internacionais. Na mostra, apresentaram a performance Respiração +.
A obra que apresentaram na mostra é constituida de dois aquários, um ao lado do outro, cheios de água, numa altura de 1,50 do chão. No momento em que inicia a performance, dois artistas vestidos de terno e gravata entram nos dois aquários e ao sinal de uma campainha acionada por um terceiro artista, ambos submergem. Novamente o sinal é acionado, e um deles se ergue e começa a declamar um longo texto a respeito da respiração, como no trecho a seguir:

"A respiração é um ato obrigatório mas involuntário e inconsciente, e não se toma conhecimento. A respiração tem como função: uma, levar oxigênio ao sangue a fim de alimentar todas as células do organismo. A segunda é expelir o gás carbônico. O gás carbônico não pode permanecer no organismo. Caso isso aconteça, haverá intoxicação (...)".

No entanto, o texto não é recitado inteiro, pois cada vez que o terceiro artista toca a campainha, o ator que está falando submerge, e o que estava na água emerge para falar seu texto. O primeiro intervalo entre as campainhas é de 5 segundos. O segundo é de 7 segundos. O terceiro de 10 segundos, e assim por diante. A velocidade com que falam não permite que respirem profundamente, nem mesmo o tempo que têm para tomar fôlego antes de novamente submergir, o que torna assistir a essa performance algo bastante agoniante. Esse ritual dura aproximadamente 20 minutos, o que torna os intervalos finais extremamente longos, a ponto de os artistas não resistirem e terem que subir para respirar antes do toque do sinal. Mas ainda assim, eles sobem e declamam seu texto, retornando à água assim que o sinal volta a tocar.

Impressiona bastante a performance no seu todo, pois ao final é possível observar a exaustão dos dois artistas. No entanto, o modo como os Irmãos Guimarães trabalham é de forma bastante teatral, não sendo possível saber se esse cansaço faz parte ou não do atuar.

É interessante as diversas interpretações que se podem ter dessa obra. Uma delas leva em conta a disposição do cenário. Os aquários, um ao lado do outro, são como que os pulmões, e ao centro, onde fica o artista com a campainha, o cérebro ou sistema nervoso central, controlador do corpo, tanto dos movimentos voluntários quanto involuntários. No princípio, tudo é controlável, tudo obedece, mas quando se caminha para situações extremas, se perde o controle, não se resiste até o fim da campainha, não importanto o quanto que a mente mande, o organismo acaba mais forte. Haverá quem diga que isso é para os fracos, e que nas artes orientais há um autocontrole em que o desejo da mente supera todo o corpo. A isso aponto então as roupas que os artistas usavam: terno e gravata, vestimenta característica do povo ocidental, onde esse auto-domínio não impera, ou pelo menos não é tão forte.

E esse texto evocado pelos artistas também remetem a esse universo ocidental, onde o conhecimento científico permeia as ações do homem desde o renascimento, onde começou a ser mais fortemente desenvolvido o método científico. É no entanto de se questionar a importância desse tipo de saber num momento desesperador como esse: que importa as características do processo respiratório num momento em que me afogo? Que ajuda me dá conhecer isso se o que eo preciso é respirar? Chega mesmo a atrapalhar, pois falar impede uma profunda tomada de fôlego, coisa que o instinto cuidaria com muita propriedade por si só.

Aqui, link para o página da mostra sobre os artistas. As fotos desse post são do Pedro Conti.

sexta-feira, 10 de outubro de 2008

...intervenção sonora...

Aqui vai uma pequena mostra do poder dessa Mostra Sesc. 

É o trabalho do artista Luke Jerram, inglês. Chama-se Play me, I'm yours (Toque-me, Sou teu). Trata-se da inserção de sete pianos pela cidade, em lugares inusitados, onde o pedestre está simplesmente convidado a sentar e tocar. Qualquer um. 
É um trabalho belíssimo! A possibilidade de ouvir a monstruosos desconhecidos, que temos certeza de serem como nós, trabalhadores, que ao passarem, distribuem a quem quiser ouvir um pouco de seu oculto talento. Os ouvintes não vão ao encontro da música, mas são capturados por ela enquanto caminham, são fisgados pela orelha, puxados, e ficam observando absortos a um desconhecido que os maravilha com sua habilidade. E não são pessoas selecionadas que assistem, mas trabalhadores, executivos, moradores de rua, todo tipo de homem, de toda classe, profissão e crença. 
Interações sociais ocasionadas por um simples objeto inserido num contexto que não o seu. A quebra da rotina, tema dessa mostra do sesc, é o que causa essas novas interaçoes entre as pessoas. Qualquer coisa que fuja do normal sempre resultam naquela olhada para a pessoa do lado, com cara de espanto. Tanto uma vaca de cerâmica na avenida Paulista, quanto uma iluminação inusitada, também um colete salva vidas numa estátua em pleno centro de São Paulo, e um piano no largo do pinheiros. É simplesmente mágico.
Antes de encerrar com o link, colocarei aqui alguns posts do site do projeto Play me, I'm yours.

"Saio do metro depois de mais um dia, ou melhor, uma noite na sala de aula com meus alunos. E ainda dentro da estação saindo pelo corredor ouço os primeiros acordes, me aproximo, o sujeito engravatado que sentava ao piano é Antonio, tocou várias, a qual arrisquei cantarolar, um outro que se aproxima de mim é Alexandre, conversamos um pouco, Antonio vai embora ficamos eu Alexandre e uma moradora de rua, Alexandre arrisca mais uns acordes, fechamos o piano temerozos do que poderá acontecer com ele, e seguimos conversando para nossas casas.
No outro dia eis que estavamos todos lá, Antonio, Alexandre, Eu, a moradora de rua, e o Piano...
Por favor deixem ele ficar...." - Augusto

"Saída do metrô Santa Cecília ... Um piano ... Uma criança cega, junto com a mãe, brinca nas teclas, e a luz da música brilha em seus olhinhos ..." - Patrícia

"Quando fomos instalar o piano na Santa Cecília, aconteceu o inusitado: Eis que do nada , aparece um sujeito barbudo entre vários mendigos. "Sai da frente que agora eu vou tocar..." Isso depois de várias performances dos mesmos. Após abrirem o espaço. A figura inusitada, recém chegada das fábulas do "Senhor dos anéis" senta no banco e inicia: " Salve o Corintians....." tocou direitinho todo o hino, e arriscou uns acordes no final....." - Marcelo

E aqui, o link.


...mostra sesc de artes 08...

Todos os blogs que eu frequento estão fracos de assunto nas últimas duas semanas... Diferente deste, que com o início da Mostra Sesc de Artes 08 teria assunto para quase que um ano inteiro de postagens quinzenais. A mostra começou dia 08 de outubro e vai até dia 18 de outubro, com diversos trabalhos nas mais diversas mídias e extensões por todas as unidades do sesc na cidade. Visitarei algumas obras, e depois posto aqui algo sobre elas. Por enquanto, deixo o texto de apresentação do encarte da mostra:
"pausas, deslocamentos, contemplações. Desejos que se traduzem nas ações artísticas que ocuparão as unidades do SESC SP no período de 08 a 18 de outubro. Partindo da inquietação presente no cotidiano da cidade, ou da rotina quase sempre eufórica de seus habitantes, a atual edição da MOSTRA SESC DE ARTES busca criar pausas poéticas e instantes de ruptura para o público, transbordando suas intervenções artísticas para a aescala urbana ao redor.

A produção artística contemporânea - nas linguagens de artes visuais, artemídia, dança e teatro - permeia a amostra buscando provocar os sentidos e aguçar percepções. São cerca de 80 projetos, de artistas nacionais e internacionais, apresentados em 15 unidades do sesc na capital e grande São Paulo.

Não se espante se, ao caminhar por uma unidade do sesc ou por seus arredores, você se deparar com bailarinos em paredes, prosas em elevadores ou, mais adiante, orquestras em semáforos: assim multiplicados os cenários de fruição, multiplicam-se os olhares e as esculturas - função primordial da arte".

Para não passar esse post em branco, deixo aqui um link para uma das obras. Eu, pelo menos, já "faço parte" dela... Ao seu fim, postarei aqui tudo que recebi dela.
Aqui, outro link para o site do próprio SESC.