quinta-feira, 13 de agosto de 2009

...como um idiota...

A gente costuma não saber falar bem das coisas que mais nos tocam, pois chega a ser irracional. Não sabemos bem o porquê, mas aquilo mexe conosco de tal maneira que não é possível objetivar em palavras uma justificativa plausível e que cause a mesma coisa nos demais.

E, para mim, isso acontece com as músicas do Milton Nascimento. Quase todas. Não sei falar delas, fico como um idiota procurando palavras, e simplesmente resulta em algo ridículo. Já tive experiência com outros dois posts sobre o assunto (aqui e aqui), e vi que não dá certo. Por isso, vou simplesmente colocar aqui a primeira música na voz dele que me rendeu (pois a composição não é dele).



O monstruoso solo do final é do Toninho Horta. Quem for ao Festival Música do Mundo poderá acompanhar a ambos, e quem sabe até em algum momento juntos...

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

...vazio de idéias...

Eu entendo perfeitamente a resistência de muitos quanto à arte contemporânea. Ela se mostra vazia uma consideravel quantidade de vezes. Mas às vezes ela até que é boa, o que não ajuda muito é o texto curatorial dela. E para ilustrar tal ponto, segue uma análise não da obra, mas do texto que "contextualiza" um trabalho que encontrei.

A obra se chama Éter, da artista Alice Shintani. Está expondo nesse momento na Galeria Virgílio. A obra parece interessante pela foto, e o texto que se coloca após ela também:

"Como olhamos o que olhamos?


Em que medida percebemos as pessoas, as coisas, o mundo, para além de um mero reflexo de nós mesmos? Buscamos de fato o estranhamento de um novo encontro ou procuramos o conforto do familiar? Agüentamos esse estranho ou necessitamos logo identificá-lo, rotulá-lo (e descartá-lo)?"

O texto segue. E segue, logo após ele, o "Texto-crítico" (as aspas já vieram do próprio site, quase ironicamente), e o texto finalmente:

"Artistas são endossados por exposições. Exposições são endossadas por textos-críticos. Textos-críticos são endossados por citações a pensadores. Pensadores são endossados por artistas:

“A obra de arte não é um instrumento de comunicação. Aliás, a arte não tem nada a ver com comunicação. Ela não contém a mínima informação. O que existe, ao contrário, é uma profunda afinidade entre obra de arte e ato de resistência.” [G. Deleuze]

“Mas o que significa resistir? É antes de tudo ter a força de des-criar o que existe, des-criar o real, ser mais forte do que o fato que aí está. Todo ato de criação é também um ato de pensamento, e um ato de pensamento é um ato criativo, pois o pensamento se define antes de tudo por sua capacidade de des-criar o real.” [G. Agamben]"
Eu acredito que foi a própria artista quem escreveu isso, e não um crítico efetivamente, mas enfim. A análise é válida de qualquer maneira (embora acredite que não seja tão necessária assim, com tamanha pérola que encontrei). Vamos da primeira parte:

"Artistas são endossados por exposições. Exposições são endossadas por textos-críticos. Textos-críticos são endossados por citações a pensadores. Pensadores são endossados por artistas".
O que se pretende aqui é um falso silogismo. Irônico de certa maneira, pelo menos ao meu ver. Digo isso pelo seguinte: endossar é demonstrar apoio a alguma coisa ou idéia. Assim, é sustentar essa idéia. Quem sustenta o artsita é a exposição. E a exposição só se encontra completa quando há um texto crítico para ela, senão, não é exposição (o que é uma grande balela). Textos críticos se constróem e encontram justificativas em citações a pensadores (para não dizer encher linguiça). E quem sustenta o pensador é justamente o artista, que cria a demanda por seus textos. Tudo claramente uma grande bobagem, e espero do fundo do coração que o intuito de tal sequência de idéias tenha sido com intuito humorístico... Mas o texto continua. Justamente com uma citação para que o conteúdo do trecho anterior seja endossado:

“A obra de arte não é um instrumento de comunicação. Aliás, a arte não tem nada a ver com comunicação. Ela não contém a mínima informação. O que existe, ao contrário, é uma profunda afinidade entre obra de arte e ato de resistência.” [G. Deleuze]"
Nada menos do que Deleuze. Não sei se o leitor vai me achar agora um tanto quanto atrevido, mas me parece nesse momento pelo menos óbvio que a citação não faz o menor sentido. Mesmo que deslocada de sua fonte, afirmar que uma obra de arte não é instrumento de comunicação é algo que deve causar ânsias a qualquer pensador descente. Antes de continuar, vai o trecho seguinte, para que a idéia esteja completa na hora de falarmos dela.

“Mas o que significa resistir? É antes de tudo ter a força de des-criar o que existe, des-criar o real, ser mais forte do que o fato que aí está. Todo ato de criação é também um ato de pensamento, e um ato de pensamento é um ato criativo, pois o pensamento se define antes de tudo por sua capacidade de des-criar o real.” [G. Agamben]"
Agora o vazio intelectual está simplesmente completo. Deleuze nos apresenta a idéia de que a obra de arte não é comunicativa, não é instrumento de comunicar, e nem contém informação alguma. Nego essa idéia do seguinte ponto: mesmo que pensemos que a obra de arte não é feita para o público, mas é por vontade espontânea do artista, é errado colocar que ela não é comunicativa pelo simples fato de ela ter-se materializado. Se um artista faz uma obra, é porque a julga com algum tipo de conteúdo digno de ser exposto a algum interlocutor, e assim o fazendo, sela o ciclo comunicativo que Deleuze nega.

Vendo ainda por outro ponto de vista, colocar que não há informação numa obra é selar o destino da arte como um todo a um nada. Se não há informação numa obra, o que são as descrições dos críticos de arte, e às vezes do próprio artista? A arte está baseada num código, mesmo que esse seja o idioleto do artista. E esse código semioticamente já se expõe como comunicativo, bastando que se sele a tríade "objeto-signo-interpretante". É meramente uma grande duma masturbação mental querer negar esses pontos tão evidentes.

E para tentar justificar a bobagem colocada anteriormente, o trecho seguinte fala o que é a resistência que Deleuze havia falado. E segue mais um silogismo, com um interessante adendo, que é a mania pós-moderna de colocar a "(des)construção" como a opção intelectualmente mais avançada (até o ponto de colocarem num livro de design contemporâneo um artigo mediocremente escrito que tratava justamente disso: a (des)construção da imagem. Só não entendi muito bem onde, pois o autor falou apenas de sua carreira). E talvez seja esse um dos problemas da arte contemporânea: ela é pouco propositiva, e por demais descontrutiva (sem os parênteses). Assim, somando isso com textos críticos como o aqui apresentado, sinto muito, mas a única coisa que vai conseguir mesmo é incompreensão...

Correção: Ao que me parece, falar bobagem não parte apenas de críticos de arte... Esse post fala de um texto crítico que não é um texto crítico, mas uma das obras da artista-base do post, Alice Shintani (ver, por favor, os comentários). Bom... O erro foi FEIO e ESDRÚXULO, e peço desculpas. Entendam então como um paralelo para o que eu quis dizer, ou mesmo como uma análise da obra "Texto-Crítico".